Por: Wilmar D’Angelis, linguista e indigenista
Ouço o lamento marubo
das mortes anunciadas.
Ouço em matsés o lamento
das canções silenciadas.
Dos kanamaris se ouve
mesmo choro inconsolado.
Korubu também pranteia
o silêncio da floresta
ante o crime organizado.
Ouço até a voz, ao fundo,
de clamor dos isolados.
Não faz tempo, parecia
serem fatos isolados;
no dizer de autoridades:
“infeliz fatalidade”.
Mas já não existem meios
de esconder a realidade,
ou negar os interesses
por trás dessas crueldades.
Pra começar lá de cima,
tem político e ministro,
empresário e financista,
tem os comandos do tráfico,
a bancada armamentista,
empresas transnacionais,
contrabandistas de armas,
os fascistas e racistas.
Pra completar a quadrilha,
formando os elos finais,
estão grileiros armados,
madeireiros ilegais,
garimpos patrocinados
lavando milhões de reais,
invasores de reservas,
políticos regionais,
senhores do agronegócio,
pescadores ilegais,
e pra terminar a lista:
jagunços apaniguados
de autoridades locais.
Hoje, enfim, se tem um nome
que encarna a selvageria
dessa corja de “homem branco”.
Sinônimo de “barbárie”,
de apoio dos criminosos,
caraíbas assassinos,
que derrubam a floresta,
dos rios, tiram a vida.
Um nome que lembra horror:
política genocida.
Já ir pensando no nome
que a isso tudo representa,
dá pra juventude um norte,
na luta que se apresenta:
salvar a nossa floresta
e os povos que vivem nela!
Salvar a democracia,
e a beleza e a magia
que traz, a diversidade,
para o nosso dia a dia!
Virar a página triste
desse governo fascista,
voltar a ter alegria
encher um país de artistas.
Porque hoje o amor também
tem nomes e sobrenomes;
dois homens que se doaram
pelos povos da floresta,
que amaram a nossa terra,
como não sabem amar
os covardes que os mataram
e os políticos hipócritas
que se enrolam na bandeira
prá esconder seus corações
de párias e lesa-pátrias.
Não esqueçamos jamais
os nomes dos que morreram
cruelmente assassinados:
o pernambucano Bruno
Pereira, indigenista,
pai de dois belos meninos,
casado com Beatriz;
e, com ele, o amigo Dom
Phillips, o jornalista,
de coração brasileiro,
casado com Alessandra,
que agora habita a floresta
que o apaixonou primeiro.
Ouço o choro inconsolado
dos marubos na aldeia,
e o silêncio das canções
do povo kanamari.
Ouço vozes embargadas
pelo choro dos matsés;
os prantos intermináveis
dos korubus consternados,
e o mais profundo lamento
nas línguas desconhecidas
de povos abandonados.
Nos unimos aos seus prantos
que nos vêm do Javari.
Também a floresta chora
seus filhos mortos ali.
Ela já os adotara
e chora ao vê-los partir.
Bruno e Dom, muito obrigado,
por apontar aos mais jovens
o quanto há por fazer
para salvar o planeta;
entregando suas vidas,
morrendo pros seus amores,
regando a mata com sangue
pra um mundo melhor nascer!
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